sábado, 27 de dezembro de 2014

acho

eu penso e investigo
e tento responder à pergunta de sempre:
quem sou?

e me perco em tentativas
e narrativas,
imagino se a resposta não é algo entre
quem eu acho que sou,
quem os outros acham que eu sou
e quem eu acho que os outros acham que eu sou.

no fim, fica a sensação de que
todos estes achos foram demais.
pelo menos, é o que eu acho...

domingo, 21 de dezembro de 2014

tempos inocentes

a gente se volta pro passado com um olhar inocente, imaginando que aqueles, sim, eram tempos bons, tempo de gente mais idealista e inocente. e nem se dá conta conta do quanto a gente não sabe do nosso tempo, mais ou menos na mesma medida em que essa gente não sabia do delas.


segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

as causas perdidas

já repararam nessa música dos engenheiros do hawaii, dom quixote? dom quixote. sim, sou eu. me identifico com ela. =]


sábado, 13 de dezembro de 2014

condenados à liberdade


condenado porque não se criou a si próprio; e, no entanto, livre, porque uma vez lançado no mundo, é responsável por tudo quanto fizer. (jean-paul sartre)

ideias


ideias

o cuidado
de não pensar
novas ideias
com as linguagens
de sempre.

gente

gente

gente que já nasceu
não nascida,
gente que luta pela existência
enquanto tem gente filosofando
sobre o verdadeiro
sentido da vida.

gente estropiada,
cansada,
aniquilada,
gente que não tem
direito a nada,
nem à vida!

gente...
gente?
gente!!!

sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

formiga

formiga

a formiga caminha
decidida. faz seu caminho
pela folha. se acha
senhora de si.

e nem se dá conta
de que a folha em que caminha
está solta no vento,
ao-deus-dará.

soltinha.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

coringa revistado


acho que nunca pensaram em fazer o coringa como mulher porque ficaria psico demais. eu sei, tem a arlequina, mas a paixão dela pelo coringa (homem) dá um alívio gigante no terror que poderia inspirar. subalterna demais...

essa daí é a minha versão do coringa e seria, ao mesmo tempo, adorável e terrível. muito pior (ou melhor) que sua versão masculina...

nublado


tá, eu confesso: é algo
entre a inocência e a audácia
essa ância em convocar
um dia nublado
de compania para meu pranto.

mas é que a dor
é minha e tamanha
que não vejo alternativa:
nada menor daria conta
da imensidão.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

luana


o cabelo escorrendo
no pescoço, cuidadosamente
displicente foi arrumado
pra deixar evidente
a tatuagem: um oito deitado.

acho que começo
a entender - visceralmente -
o significado da expressão
"se perder no infinito".

terça-feira, 9 de dezembro de 2014

a primeira vista

de olhos cruzados
num corretor apertado,
corações tumultuados...
um fim previsível:
enrolados.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

de garrafas e cartas



eu queria falar de lacan,
de destinatários e cartas
e relacionar o conceito com garrafas.
mas eu já esvaziei algumas
e fazer relações nessas condições
é coisa problemática.

eu sei que tinha a ver com
cartas em garrafas,
ou com garrafas vazias
que nos fazem escrever cartas,
ou seriam cartas vazias
por causa das garrafas bebidas?
talvez tivesse a ver
com destinatário que não
devia ler, mas leu,
ou, ainda, com garrafa na carta
e remetente que era o destinatário
que, no fim, era eu.

bem, fazia sentido quando
formulei essa relação...

natureza morta

eu não gosto
de natureza morta.
me interesso mais por vida
irresponsável ou livre ou em crise,
em ascenção ou declive,
cheia de ondulações
e todas as possíveis atribulações.

eu... eu quero ver
vida admirável ou torta,
ver os trambiques,
tropicões e chiliques,
o que faz a gente
terminar a noite angustiado
afogando as mágoas num alambique.

quero ver daquilo que te põe a prova,
que te tira do sério,
que te leva pra longe de qualquer limite...
porque lá no fundo,
que importa?

importa que a vida
acaba uma hora.
e que quando a morte
lá na frente,
vier bater à porta,
vai ser uma bosta
não chegar à conclusão
de que todo esse tempo gasto
não valeu nem um tostão.
ou um palavrão de admiração.
algo dito de coração aberto
e boca cheia de convicção:
uau, deu trabalho...
mas foi foda.

o mar

é de espaços perdidos
e conquistados
do que vai sendo desconstruído
e rearranjado.

é de tempo perdido
ou totalmente e tolamente
aproveitado.

é muito do mar,
que diverte e invade
e sustenta
e deixa molhado.


domingo, 7 de dezembro de 2014

a filosofia em ir tocando em frente

vai saber o que tava na cabeça do almir sater e do renato teixeira quando compuseram tocando em frente. nesse artigo na wikipedia, parece  eles deram uma ideia de como aconteceu, o almir dedilhando e o renato em epifania, inspirado na melodia.

conversando hoje com a crica, ela achou sartre nessa passagem,
cada um de nós compõe a sua história
cada ser em si
carrega o dom de ser capaz
e ser feliz
ao que eu concordo - não é a toa que eu amo essa mulher. eu vejo tanto a insinuação de que a experiência precede a essência quanto a afirmação de que estamos condenados à liberdade. gosto dessa visão. mas dá pra ir longe, se a gente quiser. eu achei um pouco do budismo, da busca por menos paixões na vida (não sei se quero isso pra mim), como nesse trecho:
Ando devagar
Porque já tive pressa
E levo esse sorriso
Porque já chorei demais
ou do sócrates e seu "só sei que nada sei", como nesse trecho:
Só levo a certeza
De que muito pouco sei
Ou nada sei
de qualquer forma, acho que essa letra é fabulosa e lida com assuntos complexos numa linguagem simples. e o fato da gente conseguir cruzar com correntes de pensamento de tempos históricos tão distantes só mostra que ainda não tem nada resolvido. tá cada um aí tentando buscar seu equilíbrio.


saltos


sábado, 6 de dezembro de 2014

jogos


a perdição de sméagol

essa parte em que o gandalf responde ao frodo, que havia acabado de dizer que o gollum merecia morrer é muito forte:

- merece! ouso dizer que sim. muitos que vivem merecem a morte. e alguns que morrem merecem viver. você pode dar-lhes a vida? então não seja tão ávido para julgar e condenar alguém à morte. pois mesmo os muito sábios não conseguem ver os dois lados.

eu gosto de cruzar esse comentário do gandalf com essa cena em que o gollum-sméagol acabou de retomar o anel para si, arrancando o dedo do frodo com uma mordida. eu fico pensando o que passava no coração desse carinha nesse momento, o amor e o ódio que ele nutria pelo anel porque sua vida só girava em torno disso...

não são os grandes que me cativam nessa história. boromir, sam ou sméagol são muito mais interessantes que o frodo, o gandalf ou o legolas.


sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

a praia


meta-escritos

por que maiúsculas
ou parágrafos ou pontuação
por que não se preocupar menos
com o conteúdo mais com a
forma de transgressão

e daí que faltam vírgulas e pontos
não estou lidando com tontos
queria provocar o leitor
tirá-lo dessa passividade
testar se dava
pra passar minha mensagem com tensão
não me aferrar tanto à formalidade

e olha que nem fui longe me
desconstruindo ainda escrevo da esquerda
para a direita uso vogais apelo
aos coloquiais não usei nenhum neologismo

no fim não tem nada de revolução a parada
é mais simples experimentação





quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

linguagem

é que eu me canso
dos ismos e dos egos,
tem muito cabeça de prego
me dizendo o que fazer.

tudo gente pedante e chata,
selfólatra,
buscando autoafirmação,
vendendo ética numa estética
pouco voltada à prática...
ou à ação.

velhos modelos novos
apresentados como a grande solução
dos problemas que você
não tinha...
até então.

realidade fabricada?
ela já é virtual,
faz tempo,
quem ainda não percebeu?

se o mundo é todo linguagem,
vamos falar todas essas línguas:
alguém por aí?

quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

os trilhos

vou caminhando
e pensando
e me perguntando do caminho.

e não atino com o sentido...

o que levar?
com quem viajar?
onde parar?
quais lugares visitar?

sem respostas definitivas,
continuo caminhando.
e caminhando.
e caminhando.

mas não pelos trilhos.
isso eu aprendi:
trilho não foi feito pra gente.

paleta

um pequeno poema ilustrado:

paleta já está tão démodé
que daqui a pouco,
gourmet
vai ser o bom e velho picolé.


terça-feira, 2 de dezembro de 2014

trilha sonora

até pareço normal, mas quando estou com o fone, ouvindo minhas músicas... elas viram trilha sonora dos filmes e dos clipes que eu invento com vocês aí, do lado de fora.


segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

o desate

diante da tarefa
de desatar,
a conclusão de matar:
já não somos nós.

sim, ficou a bela trama,
agora fora de moda,
mosaico de amor e tesão
e erros e acertos
e paixão e tropeços...
mas é hora,
meu deus como é hora,
de uma nova história.

ou melhor, duas:
pra buscar novas texturas e padronagens,
um novo colorido.


segunda-feira, 24 de novembro de 2014

aaaaaaahhhhhh


aprendizado: intuição

sem o apoio de trailer, crítica ou sinopse, cheguei na bilheteria querendo evitar qualquer filme que falasse de guerra, aventuras, explosões ou emoções extremas... enfim, nada de histórias de amor. meio difícil de adivinhar só pelo título. a próxima sessão era a das oito, o que me dava quase três horas para ficarmos sozinhos eu e meus pensamentos. não era um bom dia pra isso, mas não podia ser diferente.

achei uma mesa vazia num bar próximo. sentei e pedi o de sempre: cachaça. logo comecei a me incomodar, como se alguém sinistro me observasse. não achei ninguém...

uma ou sete doses depois, a sensação de estar sendo observado permanecia, mais forte que nunca. e se tem alguma coisa que eu aprendi nesses anos todos, é que a gente tem que aprender a confiar na intuição. meticulosamente, sondei o ambiente em busca do sinistro. até que o encontrei: na sacada, do outro lado da rua. de terno cinza, camisa e gravata brancas, chapéu escuro. e aquela máscara que não sinalizava nenhuma boa intenção. merda! lá estava ele, imóvel e me encarando, com um braço esticado se apoiando na parede. que estranho...

de fato, a figura era estranha porque era só um manequim.

se tem outra coisa que aprendi com tudo isso, é que há momentos em que a gente deve confiar na intuição e há momentos que não. agora, precisava aprender a diferenciar um momento do outro...

sábado, 22 de novembro de 2014

o problema dos chatos

(publicado em 24/02/2014 no http://umatrapizonga.wordpress.com)
tenho pensado muito sobre álgebra linear nos últimos tempos e de repente me dei conta de que ela poderia ajudar a modelar o pensamento humano. penso que a evolução dessa ideia nos levaria a um amplo desenvolvimento da piscohistória, do hari seldom, personagem de isaac asimov, mas eu não tô muito preocupado com isso; acabei de me deparar com uma possibilidade bem mais atraente: lidar com os chatos, pobres pessoas que não conseguem ocupar muitas dimensões do pensamento.
refletindo sobre essa ideia - ainda não formalizei o estudo, estou só adiantando algo do trabalho, pra ver se alguém mais tem interesse em pesquisá-lo - percebi que o problema do mundo são os chatos. mas penso que dá pra resolver.

engenharia social

























engenharia social

o tecido social se apresenta
em trama justa e padronada.
os fios estirados,
à beira do colapso,
todos coloridos...
artificialmente.

matéria-prima habilmente selecionada:
o fio fraco não serve,
de outra cor, não serve,
de outra textura, não serve.

ainda assim, mesmo após
laborioso processo,
não se chegou a um tecido bonito.

sábado, 15 de novembro de 2014

Gelidez Burguesa




Bertold Brecht não cita explicitamente o termo "gelidez burguesa" em Intertexto, mas tem tudo a ver.

Intertexto
(Bertold Brecht)

Primeiro levaram os negros
Mas não me importei com isso
Eu não era negro

Em seguida levaram alguns operários
Mas não me importei com isso
Eu também não era operário

Depois prenderam os miseráveis
Mas não me importei com isso
Porque eu não sou miserável

Depois agarraram uns desempregados
Mas como tenho meu emprego
Também não me importei

Agora estão me levando
Mas já é tarde.
Como eu não me importei com ninguém
Ninguém se importa comigo.

sexta-feira, 14 de novembro de 2014

são só negócios

um pouco de poesia-desenho:


são só negócios

pela eficiência, alinha
o pessoal ao profissional.
exigência dos negócios,
constante aperfeiçoamento.
pecado mortal: o ócio.

a vida planejada em cronograma,
se pauta por metas e marcos.
a felicidade medida na frieza
dos gráficos e indicadores,
monitoração em tempo real,
no colorido dos dashboards.

afinal, a vida precisa de algum colorido...

terça-feira, 11 de novembro de 2014

imperativo

cercado de imperativos...
é muita gente querendo que eu queira.
é muito do tal do assista,
ou dos insistentes
compre ou venda.

me empurram os assine,
os programe, os entenda.
e já que chegaram a tanto,
devem pensar,
por que não um não perca?

o que há de bom
pra que insistam tanto que eu veja?
ou nessa relação artificial
do tenha com o seja?

quer saber,
vocês que adoram verbos,
tenho um pra vocês: fodam-se!

domingo, 2 de novembro de 2014

Piada velha: a lâmpada

Piada que a gente contava quando era criança... faz teeeeempo!

Pessoalmente, gosto muito da postura do enfermeiro: tem empatia com seus pacientes. =]

quinta-feira, 30 de outubro de 2014

O Menino e o Tempo - Livro Infantil

Acabei de terminar outro livrinho infantil experimental: "O Menino e o Tempo".

Como o livro anterior, Vamos Brincar de Carrinho?, este também é de livre distribuição e você pode baixar nos formatos CBZ e PDF. Fique a vontade!

O Menino e o Tempo conta a história de Menino, uma criança fazendo uma investigação bastante sofisticada sobre o Tempo. O que achou?

quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Pessimismo social em Python

Já algum tempo, venho me incomodando com essa onda de pessimismo generalizado com o Brasil que acompanho na internet. Parece que fomos perdendo a fé em tudo, na política, na democracia, na propensão das pessoas em serem legais umas com as outras. Acho que isso facilita o isolamento individual, desfavorecendo a solidariedade e a empatia, ao mesmo tempo que estimula uma competitividade insana e todo tipo de tolerância.

Não sei, não parece legal viver numa sociedade assim.

Acontece que, trabalhando com TI todo dia, acabo usando os modelos mentais da minha profissão para analisar os problemas em outras áreas - isso é mais forte que eu, não consigo evitar. Assim, como naquele dito do Mark Twain: "para quem tem um martelo, todo problema vira um prego". De qualquer forma, foi pensando em agrupamentos humanos que lembrei que esse problema do "pessimismo social", por se tratar de gente interagindo com gente, podia ser modelado com agentes.

Sendo bem rápido na explicação, os agentes podem ser entendidos como autômatos que interagem uns com os outros, bem como com o ambiente em que vivem, recebendo estímulos ou realizando ações sobre eles. Na primeira figura, você pode verificar o esquema de um agente.

Uma maneira bem simples de implementar as relações entre os agentes é através de uma matriz bidimensional. Como demonstrado na figura ao lado, dependendo da posição do agente na matriz, ele pode ter 3, 5 ou 8 vizinhos: e a vizinhança define uma relação entre os agentes. Dependendo do problema sendo trabalhado, essa simplificação pode ser satisfatória.

O bacana de recorrer a simulações de computador é que suas pesquisas não serão limitadas por um comitê de ética. Você pode, por exemplo, provocar sofrimento em suas cobaias ou pensar em situações constrangedoras para ver como reagem e ninguém vai te criticar por isso - afinal, são só agentes, simulações de computador. Também pode testar cenários diferentes, variando as relações, os comportamentos dos agentes, etc.

Para começar a estudar esse problema do "pessimismo social", pensei num protótipo em Python. O link aponta para código-fonte hospedado no repl.it, de modo que você nem precisa ter um ambiente Python configurado na máquina: pode testá-lo diretamente no browser.

As pessoas dessa simulação são bem simples e tudo o que fazem  na vida é receber estímulos negativos ("-") ou nêutros("."). Receber um estímulo negativo faz o humor da pessoa diminuir. Ficar um ciclo sem recebê-lo (isto é, receber um nêutro) permite à pessoa recuperar um pouco do humor anterior. Essa ideia do nêutro pode tanto representar a fuga da pessoa para realidades mais confortáveis quanto um movimento pessoal de otimismo.

A cada ciclo, pessoas são escolhidas aleatoriamente para representar o grupo dos que serão "atingidos" pela onda de pessimismo. O negativo, por enquanto, pode representar qualquer coisa: a tendência dos jornais só mostrarem notícias desesperadoras da realidade do país, a irritação de tanto imposto em janeiro ou uma lida nos últimos posts numa rede social.

Se você rodar o programa com os parâmetros padrão (matriz de 10 x 10 e 100 ciclos de simulação), verá que o humor do grupo passa de da casa dos 75 para a casa dos 50: uma redução de 1/3!

Gostou da minha trapizonga?

Trapizonga é uma palavra interessante porque muita gente não a conhece... dá pra fazer brincadeiras com ela.

Por exemplo, como sugeri nesse quadrinho, parece significar o órgão sexual masculino (podia escrever pau ou cacete, mas não queremos matar do coração as almas mais inocentes, não é mesmo?), mas é puro engano.

Eu conhecia no sentido de gambiarra, que se aproxima muito da ideia de monjolo (espécie de moinho) que você pode ver aqui, mas o Priberam nos informa alguns significados adicionais:
1. [Brasil] Mixórdia;
2. Coisas confusas ou desordenadas;
3. Porção de trastes miúdos.

De certa forma, como autor do blogue, fico contente com todos estes significados, tomados um a um ou de uma vez só.

O fim da democracia

Ontem, 28/10/2014, meio que a toque de caixa, o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) conseguiu derrubar o decreto presidencial que regulamentava a PNPS, a Política Nacional de Participação Popular. Em tempos de defesa da apolitização e de tanto pessimismo com a política e com a classe política, eu via a PNPS como um (pequeno) passo no sentido contrário - a ideia era, justamente, fazer as pessoas se sentirem as donas que são da coisa pública (res publica). Afinal, como aponta Arnold Toynbee:

"O maior castigo para aqueles que não se interessam por política, é que serão governados pelos que se interessam."

No meio de tanta crítica orquestrada contra a PNPS, vale a pena citar um artigo que vai na contramão: O que é a Política Nacional de Participação Social, que explica em palavras simples o que é a PNPS. Também é interessante ler o próprio texto da PNPS, DECRETO Nº 8.243, DE 23 DE MAIO DE 2014, para entender do que se trata: um decreto que consolida mecanismos e formas de participação social instituídos pela Constituição de 88 e regulamenta a LEI Nº 10.683, DE 28 DE MAIO DE 2003.

Ou seja, estamos falando de mais democracia, não menos. É uma forma de oferecer ao povo mais voz: em vez de ser chamada de dois em dois anos para contribuir para a democracia com um voto, a PNPS trazia a ideia das pessoas poderem participar mais e melhor das decisões governamentais nos vários instrumentos previstos na Constituição, tal como conselhos, conferências, ouvidorias, processos de participação no ciclo de planejamento e orçamento público, audiências e consultas públicas, mesas de diálogo e negociação, entre outros.

Eu disse trazia! A PNPS, como comecei este artigo, foi derrubada... em vez de avançar mais a democracia brasileira, vamos precisar lutar pelo que já estava conquistado.

terça-feira, 28 de outubro de 2014

O vira-lata

Já se vai mais ou menos meio século desde que Nelson Rodrigues recorreu ao termo Complexo de Vira-Latas para explicar o pessimismo dos brasileiros de seu tempo com o nosso futebol (vide as várias crônicas n'A Pátria de Chuteiras, ou o n'este backup). Seu estilo era intenso, tal como nesse trechinho:
Foi preciso que jornais alemães, franceses, húngaros, tchecos, ingleses berrassem para nós: - "Vocês são os maiores".
Nas várias crônicas a gente verifica um Nelson exasperado: uma geração de craques brilhantes - artistas! - e praticamente toda a população e imprensa não sabendo reconhecer seu valor, exigindo que esses craques criativos tentassem imitar o futebol europeu. Só porque não podiam supor que brasileiros pudessem fazer um futebol melhor...

Bem, este post não é sobre esporte, mas sobre o viralatismo denunciado por Nelson Rodrigues: ele persiste e não é só no futebol, como já não era à época das crônicas. Talvez esteja ainda mais forte nestes tempos de redes socias. Não representa a totalidade do povo brasileiro, mas é uma parcela bastante ativa nessa tarefa que tomaram para si: odiar a própria brasilidade, isto é, sua condição de brasileiro. Desta forma, odeiam o samba, o funk e a lambada, os filmes e o carnaval, os escritores, o clima, a geografia, o governo, o caráter e o próprio povo brasileiro. Não conseguem imaginar um Brasil soberano, muito menos potência regional; na opinião deste conjunto de brasileiros, devíamos assumir logo nossa condição de colonizados, de seres inferiores. Seguem um estilo bem próprio de nacionalismo, baseado no ódio e na falta de empatia com o outro.

Naquele livro do Lima Barreto, Triste Fim de Policarpo Quaresma, aparece a ideia de que "ou o Brasil acaba com a saúva, ou a saúva acaba com o Brasil" (que parece ter se desenvolvimento originalmente com o naturalista francês Auguste de Saint-Hilaire). Mas acho que não, o pensamento deveria ser reescrito da seguinte forma: ou o Brasil acaba com o Complexo de Vira-Latas,ou o Complexo de Vira-Latas acaba com o Brasil. Não é só a torcida grande do contra que fode a bagaça, tão contaminando gente que não estava assim, pessimista.

Em outras palavras, por mais ingênuo, trapalhão e determinado que Policarpo seja descrito na obra, o fato é que estamos precisando de mais gente ao modo dele. Tá foda...

Orgulho de mim

A cabeça inchada...
Um grande orgulho de mim...
Putz Grila!

Um meme de 500 anos

Um exercício mental: imagine que não mais as pessoas, mas as ideias sejam os atores. Aqui, o termo "ideia" usado num sentido bem amplo, isto é, qualquer coisa que possa se replicar entre mentes, por qualquer forma de comunicação que puder pensar.

É em torno dos memes, de como eles se replicam, interagem, fundem, dividem-se ou transformam-se, bem como são manipulados nas mentes das pessoas que a memética se estrutura. Eu sei que é meio chocante colocar ideias num plano mais importante que o das pessoas, vistas aqui mais como meros receptáculos de ideias, mas a tática talvez seja não ligar muito pra isso. Quer dizer, a memética é uma ferramenta; se oferecer resultados úteis para seu trabalho, use-a.

E o que tem todo esse texto sobre memes e memética a ver com o desenho que estou publicando?

Estava aqui pensando que existe um meme circulando pela mentalidade brasileira desde os tempos do "descobrimento":

X é vagabundo.

Por todos estes mais de 500 anos, X tem variado conforme a necessidade de quem replica este tipo de meme: índio, preto, pobre, camponês, analfabeto, etc. Mas apesar de todas as diferenças, é possível capturar uma categoria aí: gente pertencente a um grupo ou classe social que se deseja controlar ou submeter.

O que faz com que um meme como esse se perpetue? Algumas coisas me vêm a mente, tal como xenofobia, descaracterização/desumanização do outro grupo, carência afetiva... não sei. Pode até ser que suma por algum tempo da memória coletiva, mas o molde estará sempre lá, disponível até a próxima necessidade.

segunda-feira, 27 de outubro de 2014

Rudimentos de lógica na análise de discursos

A linguagem humana, ao mesmo tempo que sofisticada, também pode ser bastante confusa. A tal ponto que pode nos levar a pensamentos ou conclusões equivocadas sobre um determinado fato. Dependendo da situação, alguns rudimentos de Lógica são suficientes para esclarecer o discurso e decidir se ele é consistente ou não.

Por exemplo, considere uma sentença comum no facebook por estes dias:

A1: "Todo beneficiário do Bolsa Família é vagabundo".

Minha experiência em assuntos humanos sugere que este tipo de generalização não é consistente, mas como ter certeza? Podemos decompor a sentença A1 em:

b(x) = beneficiário do Bolsa Família
v(x) = vagabundo()

Assim, a sentença seria facilmente reescrita como: para_todo x, b(x) -> v(x) (lê-se: "para todo x, se b(x), então v(x)"). De outra forma, basta um caso de x que não atenda ao operador SE, isto é, ser beneficiário do Bolsa Família, mas não ser vagabundo, que a afirmação original se torna inconsistente. De fato, de acordo com os dados de Tereza Campello, Ministra do Desenvolvimento Social e do Combate a Fome (http://www.conversaafiada.com.br/economia/2014/10/07/campello-desmonta-o-preconceito-contra-o-bolsa/), analisando a PEA (População Economicamente Ativa) beneficiária do programa, 75% trabalha. Desta forma, se trabalhar significa não ser vagabundo, temos aí um bom número de x que derruba a sentença original. E olha que bastava um x...

Como curiosidade, a luz das novas informações, a sentença poderia ser escrita como: existe x, b(x) -> v(x) (lê-se: "existe x tal que se b(x), então v(x)"). Uma afirmação bem menos bombástica, não?

A lógica também permite análises mais sofisticadas. Por exemplo, considere a seguinte sentença, onde vamos verificar o operador OU:

A2: "Todo crítico que apela a sentença A1 ou é ignorante ou age de má-fé".

Ok, a sentença A2 pode ser decomposta em:
c(x) = critica o BF por A1
i(x) = é ignorante (isto é, desconhece os dados sobre o programa BF)
m(x) = age de má-fé (isto é, conhece os dados mas apela a uma falácia para defender sua posição)

Agora, A2 pode ser reescrita como: para_todo x, c(x) -> (i(x) ou m(x)) (lê-se: "para todo x, se c(x), então é i(x) ou m(x)"). Posto de outra forma, com A2 estamos indicando que a pessoa que recorre a A1 ou é ignorante ou age de má-fé. O que nos permite a análise do propósito do discurso. Por exemplo, a ignorância, de certa forma, é um fim nela mesma e, de qualquer forma, pode ser combatida com esclarecimento. Já no caso de má-fé, convém avaliar qual o intuito de quem está apelando à falácia para defender sua posição, mas isso já começa a fugir do assunto inicial.

sexta-feira, 24 de outubro de 2014

Democracia de espetáculo

Talvez seja inocência demais supor imparcialidade - de gente, de instituições, de órgãos de imprensa. Todos temos nossos posicionamentos - até "não ter um posicionamento" já é um posicionamento - e seria mais coerente que cada um o declarasse abertamente.

Gosto muito do conceito defendido pelo Chomsky, sobre a "democracia de espetáculo". A você, cidadão ou eleitor, garante-se o direito de ter uma opinião - que será devidamente elaborada pelos grupos que brigam pelo poder.

Pessoalmente, fico muito preocupado com a infantilidade com que estamos lidando com tudo isso, como se tudo pudesse ser reduzido à luta entre o bem contra o mal.

Uma pena para a democracia, uma tragédia para nós.

Tempo Livre


O filósofo alemão Theodor Adorno escreveu um texto muito interessante sobre o Tempo Livre (está em formato PDF nesse link), onde argumenta que o tal do tempo livre não é bem seu e que mesmo naquelas situações em que você busca fugir do sistema, continua dentro dele, apenas de outra maneira. Como no exemplo do camping: você, cansado dessa sociedade consumista é incentivado a fazer camping e consumir um rol de produtos e serviços que vão te afastar dessa sociedade consumista. Você caiu numa recursão (termo da Computação).

Decidi revisitar a discussão do tempo livre, dando meus próprios pitacos.

quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Imaginação

Descobri recente o prazer de andar sempre com um caderno; afinal, nunca se sabe quando vai aparecer um impulso criativo.

Outro dia, numa tarde deliciosa em família, vendo o pequeno brincar, comecei a viajar sobre o assunto "Imaginação". Além do desenho, rabiscado no caderno, saiu isso aqui:

Olha o menino solto ali,
está em seu mundinho inventado:
já foi rei do castelo colorido,
motorista do carrinho enferrujado.

Agora...
Bem, agora virou marceneiro.
É que havia brinquedo para ser consertado.