A linguagem humana, ao mesmo tempo que sofisticada, também pode ser bastante confusa. A tal ponto que pode nos levar a pensamentos ou conclusões equivocadas sobre um determinado fato. Dependendo da situação, alguns rudimentos de Lógica são suficientes para esclarecer o discurso e decidir se ele é consistente ou não.
Por exemplo, considere uma sentença comum no facebook por estes dias:
A1: "Todo beneficiário do Bolsa Família é vagabundo".
Minha experiência em assuntos humanos sugere que este tipo de generalização não é consistente, mas como ter certeza? Podemos decompor a sentença A1 em:
b(x) = beneficiário do Bolsa Família
v(x) = vagabundo()
Assim, a sentença seria facilmente reescrita como: para_todo x, b(x) -> v(x) (lê-se: "para todo x, se b(x), então v(x)"). De outra forma, basta um caso de x que não atenda ao operador SE, isto é, ser beneficiário do Bolsa Família, mas não ser vagabundo, que a afirmação original se torna inconsistente. De fato, de acordo com os dados de Tereza Campello, Ministra do Desenvolvimento Social e do Combate a Fome (http://www.conversaafiada.com.br/economia/2014/10/07/campello-desmonta-o-preconceito-contra-o-bolsa/), analisando a PEA (População Economicamente Ativa) beneficiária do programa, 75% trabalha. Desta forma, se trabalhar significa não ser vagabundo, temos aí um bom número de x que derruba a sentença original. E olha que bastava um x...
Como curiosidade, a luz das novas informações, a sentença poderia ser escrita como: existe x, b(x) -> v(x) (lê-se: "existe x tal que se b(x), então v(x)"). Uma afirmação bem menos bombástica, não?
A lógica também permite análises mais sofisticadas. Por exemplo, considere a seguinte sentença, onde vamos verificar o operador OU:
A2: "Todo crítico que apela a sentença A1 ou é ignorante ou age de má-fé".
Ok, a sentença A2 pode ser decomposta em:
c(x) = critica o BF por A1
i(x) = é ignorante (isto é, desconhece os dados sobre o programa BF)
m(x) = age de má-fé (isto é, conhece os dados mas apela a uma falácia para defender sua posição)
Agora, A2 pode ser reescrita como: para_todo x, c(x) -> (i(x) ou m(x)) (lê-se: "para todo x, se c(x), então é i(x) ou m(x)"). Posto de outra forma, com A2 estamos indicando que a pessoa que recorre a A1 ou é ignorante ou age de má-fé. O que nos permite a análise do propósito do discurso. Por exemplo, a ignorância, de certa forma, é um fim nela mesma e, de qualquer forma, pode ser combatida com esclarecimento. Já no caso de má-fé, convém avaliar qual o intuito de quem está apelando à falácia para defender sua posição, mas isso já começa a fugir do assunto inicial.
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